Uma reflexão sobre as relações de poder e de colaboração no relacionamento conjugal

Este artigo pretende fazer uma reflexão acerca da dinâmica das relações de poder e de colaboração na conjugalidade.

O interesse por estudar como se configuram as relações de poder no casal e de como estas podem se transformar em relações mais igualitárias, surge do meu trabalho como terapeuta de casal.

Durante meus atendimentos, observei que a maior parte dos meus clientes se queixam da relação com seu parceiro, principalmente nos momentos de crises.

Um deles agia de um lugar em que estava sempre certo, e com a razão o detentor do poder, enquanto o outro se sentia o perdedor. Esta dinâmica deixa os casais em um estado emocional de angústia e desespero, principalmente em aquele que se sente o perdedor, diante desta realidade e a pergunta frequente é: “Quem manda aqui?”. E esta pergunta me levou a pensar que estes casais viviam em uma luta permanente pelo poder. É importante salientar que os casais podem viver seu relacionamento não só como quem ganha e quem perde, senão construir relações colaborativas.

Neste artigo, vamos refletir sobre dois modos diferentes de viver a vida a dois: as relações baseadas em poder e as relações sustentadas na colaboração. Compreender essas dinâmicas pode ser o primeiro passo para transformar seu relacionamento em que as lutas se transformem em parcerias.

O que é uma relação de poder?

Numa relação de poder é possível observar que uma pessoa,no caso um dos cônjuges tem mais controle sobre  decisões, comportamentos e até sentimentos do outro. Este assume o controle das finanças, impõe limites sobre as escolhas do outro, decide sozinho questões importantes do casal.

Este tipo de relação envolve:

  • Controle financeiro;
  • Manipulação emocional;
  • Desigualdade na distribuição de tarefas domésticas e cuidado dos filhos;
  • Falta de espaço para a individualidade;
  • Às vezes o poder se manifesta como preocupação, proteção do outro(a).

A terapeuta de casal Mona Fishbane destaca três tipos de relações de poder, sendo eles: “poder sobre” , “poder para” e “poder com”. Quanto ao primeiro tipo, ela assinala que existem algumas formas de desequilíbrio de poder no relacionamento dos casais, uma delas é a luta pelo próprio poder em questões relativas a gênero, condição socioeconômica, educação e fatores sócio culturais. A luta pelo poder, portanto, reflete os valores sociais de competição, aprendizagem de gênero e patriarcado que fazem com que os homens se sintam possuidores de direitos sobre as mulheres, por isso não aceitam dividir o poder com elas. Por outra parte, as mulheres ainda são estimuladas a serem compreensivas e empáticas com os homens, levando-as a fazer concessões das quais se ressentem. Deste modo, a dinâmica do casal pode se tornar tóxica, ou seja a interação baseada no “poder sobre” tornando-se dominante comportamentos de crítica de ataques e retraimento ,justificativas que culpam o outro ou a si mesmo e escaladas de raiva se tornam frequentes.

“Poder para” é definido como a possibilidade de desenvolver o autodomínio, a capacidade de autorregulação, de fazer escolhas cuidadosas de acordo com seus valores. E o poder que cada um dos parceiros tem sobre suas emoções. Há algumas  habilidades que compõem o poder para tais como: flexibilidade, reflexão, auto regulação, diferenciação das suas próprias emoções além de responsabilidade relacional. Nessa direção, conforme os membros do casal melhoram seu autocontrole e capacidade de estar com o outro a que foi  atingida durante o processo de terapia de casal, eles desenvolvem o “poder para” e a lutas pelo poder são transformadas.

“Poder com” implica capacidade de cooperar, compartilhar e cuidar dos outros. Desse modo o casal compartilha o poder e a responsabilidade de cuidar da relação, desenvolvendo o Nós e trabalhando conjuntamente para criar um contexto de segurança sem serem dominados pela reatividade emocional (reagir a emoção do outro). Um dos indicativos é aprender a lidar com as diferenças, ter respeito mútuo, deixando de lado as táticas de “poder sobre”

Relações de colaboração

A psicóloga Harlene Anderson, pontua que a colaboração não se refere a um indivíduo isolado. Ela descreve a colaboração como um tipo de relação caracterizada pela mutualidade, reciprocidade e por uma atividade participativa e propositiva.

Colaborar é uma forma de se conectar com o outro e criar vínculos que convidam a um sentido de pertinência e autonomia. Finalmente, a postura colaborativa reflete um modo de ser com as pessoas incluindo formas de pensar e, agir com reagir. A palavra significativa “com” é compreendida como um processo de estar com as pessoas.

Para dar termo a este artigo, cabe ressaltar que tanto as formas de relação de poder quanto as de colaboração são próprias dos relacionamentos humanos e especialmente visíveis na conjugalidade. Nos momentos de crise os casais tendem a entrar em relações de poder que se visualiza como um círculo vicioso, difícil de sair é nesse momento que os terapeutas de casal entram em ação para construir juntos com o casal, formas de relacionamentos mais harmoniosos.

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Dra. Cecilia Astete

Desde a infância, cultivo um profundo interesse pelo ser humano em suas múltiplas fases da vida.

Ao longo da minha trajetória profissional, tive a oportunidade de acompanhar crianças, jovens, adultos e pessoas idosas, vivenciando a riqueza e a complexidade de cada etapa.

Tenho um apreço genuíno por escutar as histórias que meus clientes compartilham, exercitando uma escuta atenta e empática.

Acredito que, por trás dos relatos de dor e sofrimento, existem narrativas mais leves e potentes, muitas vezes ocultas, que podem ser resgatadas e reconstruídas.

Vejo o processo terapêutico como uma construção conjunta, em que terapeuta e paciente criam, lado a lado, uma nova forma de estar no mundo — mais leve, mais consciente e menos marcada pelas angústias que motivaram o início do processo.