Amor materno: inato ou construído?

A pergunta sobre o amor materno, se nasce com a mulher ou se depende de fatores sociais que variam conforme a época e a cultura, esse foi amplamente discutido pela psicanalista Elisabeth Badinter (1985).

Para Badinter, o chamado instinto materno é um mito. Não existe uma forma universal de maternar. A experiência da maternidade muda de mulher para mulher e de cultura para cultura. Cada mãe está imersa em valores sociais, religiosos e expectativas que moldam o que se espera dela.

A organização da sociedade e a divisão tradicional do trabalho também reforçaram a ideia de que o cuidado é responsabilidade feminina. Mas sabemos que não é apenas a mãe biológica que pode maternar. Pais, avós, irmãos mais velhos – especialmente em famílias com menos recursos – muitas vezes assumem esse papel. Em famílias com mais condições financeiras, uma babá pode ser a figura de cuidado principal. A verdade é simples: uma criança não sobrevive sem cuidados. Porém, nem toda mãe consegue estar emocionalmente disponível o tempo todo para oferecer o amor que se imagina ideal.

O amor materno é um sentimento humano e, como todo sentimento, é imperfeito, incerto e pode ser expresso de inúmeras formas. Ser uma boa mãe é apenas uma das possibilidades dentro da diversidade humana. Assim, a maternidade não está “inscrita” na natureza feminina, e o famoso “amor incondicional” é mais um conceito cultural do que uma regra biológica. Aliás, em outros períodos da história ocidental, era comum que bebês fossem entregues às amas de leite logo após o nascimento, e o vínculo materno se formava muito mais tarde.

Outro aspecto importante é a ambivalência: amar profundamente o filho e, ao mesmo tempo, sentir vontade de se afastar em alguns momentos. O cansaço, especialmente nos primeiros meses – e de maneira ainda mais intensa para as mães de primeira viagem – pode levar à exaustão, criando a necessidade urgente de dividir os cuidados e ter algum tempo para descansar e se recuperar.

Em resumo: o amor materno é uma construção. Não é instintivo nem automaticamente incondicional. Ele nasce do encontro entre crenças, valores familiares, influências religiosas e expectativas sociais e se forma aos poucos, de maneiras muito diferentes para cada mulher.

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Dra. Cecilia Astete

Desde a infância, cultivo um profundo interesse pelo ser humano em suas múltiplas fases da vida.

Ao longo da minha trajetória profissional, tive a oportunidade de acompanhar crianças, jovens, adultos e pessoas idosas, vivenciando a riqueza e a complexidade de cada etapa.

Tenho um apreço genuíno por escutar as histórias que meus clientes compartilham, exercitando uma escuta atenta e empática.

Acredito que, por trás dos relatos de dor e sofrimento, existem narrativas mais leves e potentes, muitas vezes ocultas, que podem ser resgatadas e reconstruídas.

Vejo o processo terapêutico como uma construção conjunta, em que terapeuta e paciente criam, lado a lado, uma nova forma de estar no mundo — mais leve, mais consciente e menos marcada pelas angústias que motivaram o início do processo.